quarta-feira, agosto 06, 2008

Jogo de palavras


Percebi que carrego dentro de mim força de tal devastação que se traveste de angústia e desamparo. Força que cambaleante se move, apesar dos pesares e do mistério de existir, me movendo em prol de uma vida menos cretina e mais frutífera. Sendo assim, sou lançado ao desafio diário e, mesmo perdendo quase diariamente e experimentando várias mortes, força-me a persistir, como se imbuísse da força de um tal tesouro que só eu poderei encontrar.

E com tal fome me alimento que tenho as mãos sujas por substância ainda desconhecida. Acredito que tal substância é a mistura do eu em contato com o outro que, sem se dar conta, forneceu-me a curiosidade e até mesmo a profanação e ousadia para penetração em território não permitido. E tenho a palavra, ou melhor dizendo, ela me tem, de tal forma estamos intrínsecos que já não sei mais onde o domínio de um perspassa o outro.

Apesar das quedas, traumas e do limo do poço, é nela que enfio as unhas em busca de salvação. Foi a única coisa que me restou e também o verdadeiro benefício por todas as coisas sentidas e vividas. É a palavra que vejo, sinto, toco e cheiro em todas as pequenas coisas, do amor que veio me nortear na hora mais inesperada e também na chva que observo cair durante a madrugada.

Peço que, se algo mais me for tomado, me deixem ao menos com ela. Pois com dor me desfaço de todo o resto, mas pela palavra que me salva do abismo me transformaria no homem forte que nunca fui. Sou egoísta, engulo-as todas e não as reparto nem com o mais faminto dos seres. Minha fome só se estanca quando eu enfio o dedo na garganta e vomito todo o frêmito do meu interior, para depois mastigá-la ainda mais voraz e servil.

Se necessário fosse trancar-lhes-ia no baú e só as deixaria sair com a expressão condição do trato que nos foi estabelecido de forma assertiva: se tu me deixares ainda periclitar pelo mundo dos homens, te alimento com minhas próprias entranhas.

Confesso que entrei em prejuízo nesse trato, mas sigo a ordem estabelecida. Apresento as minhas sobras em troca da sua soberania, beleza e mesmo vileza. Me perdoem os que não entendem o que expresso através desse texto, ou outros mesmo podem dizer que essa é uma relação de subserviência facilmente decifrável e explicada pela psicanálise, mas não existem mais aqui separados o homem e as letras; o que se observa é puro masoquismo: eu entrego o corpo à minha amante e dela recebo doses homeopáticas de existência. O corpo em troca de nesgas de vida. Ainda assim tem valido a pena.