segunda-feira, março 02, 2009

Caio Fernando Abreu


No meu caso, falar de Caio se torna perigoso pois posso descambar para a idolatria ou puro pieguismo, devido à grande identificação que sinto por sua obra. De qualquer forma, assumo o risco e desde já peço desculpas pelos eventuais excessos que venha cometer falando sobre ele.

Caio, ou Caio F. (como gostava de ser chamado, em alusão à Christiane F., Drogada e Prostituída, tema de livro e filme) faleceu em São Paulo, a 25 de fevereiro de 1996, em decorrência de problemas causados por ser soropositivo. Posso dizer resumidamente que ele foi um grande ícone da literatura dos anos 80, sendo no seu tempo rechaçado pelos intelectuais e críticos por assumidamente dizer que tinha grande influência da cultura pop do seu tempo. Um escritor underground que durante muito tempo, ou até mesmo os dias atuais, esteve relegado ao submundo dos malditos, por causa de sua literatura atemporal e por vezes dark. Darkésima, em alguns pontos, relembrado desde já Dama da Noite, texto contido em Os Dragões não Conhecem o Paraíso.

Nascido em Santiago do Boqueirão, pequena cidade gaúcha a poucos quilômetros da divisa com a Argentina, apaixonado desde jovem por cinema e artes em geral, se aventura na cidade grande no final da adolescência procurando dar vazão a seu afã de expressão através da palavra, tendo se sustentado basicamente do jornalismo diário, pois no Brasil são raríssimos aqueles que conseguem viver exclusivamente da vendagem dos seus livros. Caio mesmo se considera um homem do mundo, procurando ou não conseguindo fixar moradia em um determinado lugar por um longo período de tempo, tendo residido em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Campinas, na Casa do Sol, fazenda de propriedade de sua grande amiga Hilda Hilst e ocasionamente viagens à Europa, para onde emigrou em meados da década de 70, tendo trabalhado em diversos ofícios, como lavador de pratos e modelo vivo, e onde obteve grandes influências místicas que vieram a permear sua literatura e vida. Era um grande amante do misticismo, carregando suas crendices durante todo o restante da sua vida, em meio a incensos, chás medicinais e/ou alucinógenos, mapas astrais, drogas alucinógenas e muitos, mas muitos sonhos.


Ah, Caio, como você me dói de vez em quando quando releio seus contos ou me lembro de pequenas frases suas nos lugares mais inapropriados. Compartilhamos da mesma sensação de estrangeiros em busca de um nação que podemos chamar de nossas. Nossa paragem, nosso porto seguro, nossa Pasárgada onde possamos finalmente desfrutar das benesses do existir e onde possamos achar as respostas das mais agudas inquietações. A eterna busca insandecida que o fazia escrever sobre seus medos mais sombrios. Quem gosta da literatura de Caio, por algum motivo ou outro, sabe do que falo.

Em alguns instantes me pego imaginando-o, com seus óculos de grau e sua aparrência mirrada e frágil andando pelas ruas da cidade com os olhos tristes e observadores, atento aos pequenos movimentos e principalmente às pessoas que o cercam e formulando dúvidas atrozes, mas sempre com uma grave esperança de dias melhores. Certos sentimentos complexos de serem verbalizados, mas extremamente lancinantes na alma de seres de sensibilidade aguda como a dele.

Enfim, parecendo pedante ou não, afirmo que Caio F. foi uma das grandes e gratas influências surpresas que tive na vida. Havia nele não somente uma angústia existencial,mas também uma vontade enorme de viver, apesar de tudo. Mesmo com as perguntas que o perseguiam, ele adorava cuidar de suas flores e olhar o Rio Guaíba, acho que com uma espécie de sorriso irônico percebendo as sensações à sua volta e querendo somente existir e persistir. Mesmo com sua fome.







3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom, meu caro!

bichodomato disse...

Sempre digo que você tem um 'q' de Caio Fernando sou super fã, lindo amei.
Beijos no coração

Nicole Godoy disse...

Lindo. Lindo.
Eu já falei milhares de vezes no blog e por aí afora que quando se trata de Caio Fernando Abreu eu fico sem palavras. Como agora.
Mas não pude ler este teu post e deixar de comentar. Preciso dizer que assino embaixo.
;)