Não posso culpar os demais pelo meu fracasso, atribuir culpas inexistentes a terceiros, segundos e quartos. Eu fui o grande responsável pelos meus erros praticados desde a mais tenra idade. Quais seriam esses tão graves erros? Nem eu sei explicá-los muito bem, apenas senti-los e culpar-me por eles, que me sufocam e fazem com que eu olhe o espelho como meu eterno inimigo e a eu mesmo como raiz dos males mundanos. Mas não somente os do mundo exterior, mas os meus. Estes são os quais mais me atormentam, são estes que não me deixam dormir, por mais que bote a cabeça no travesseiro e tente fechar os olhos, assim procurando ausentar-me do meu corpo terreno e alçar vôos nos quais a minha existência é menos insossa e maldita.
São eles que me fazem encarar a aurora como mais um tormento, ou seja, mais um dia que se inicia. O amanhecer é perverso.
Como já disse, as palavras me faltam, só sei percebê-las, como uma espécie de máquina de choques e torturas das mais diversas, aplicadas por eu mesmo. Eu sinto, apenas isso. Já me é suficiente esse castigo. Poder exprimi-las me seria de grande valia pois assim acredito que seria menos inútil, pois poderia propalá-las aos quatro ventos: Olhem, eu existo, por mais que queriam fechar os olhos e negar o meu nascimento. Não fui o ideal buscado pela maioria. Não tive um bom emprego, não me formei, não constituí família, muito menos tive filhos, não contribuí para a Previdência Social, não comprei meu apartamento nem ao menos financiado pela Caixa Econômica, não abri conta em banco, não tive um bom relacionamento com o meu próximo, não passeei no shopping de máos dadas com a minha namorada no domingo á tarde, não mexi com as gostosas de calça apertada que passavam ao meu lado, não comprei revista de mulher pelada, não tive histórias escabrosas para contar na mesa do bar, enfim, tudo isso e mais alguma coisa.
Sim, eu não fui o ideal de ser humano. Porque eu não ando de cabeça erguida pelas ruas, pelo fato de não ter vencido na selva de pedra forjada por nós mesmos. Eu sou a prova de que nem tudo são flores e sorrisos de crianças no jardim. Eu não me adaptei ao sistema, sempre estive à margem dele, fazendo sei lá o que. Nem ao menos isso sei solucionar. Só sei que não dei certo em nada na vida, e também não sei porque teria dado, nem em que haveria de prosperar. Pois é, não sei de nada. Só sei que respiro. Enquanto respiro, me angustio. Enquanto me angustio, questiono. Enquanto questiono, me aflijo. O ciclo não se fecha nunca, a roda da vida ou morte continua a girar incessantemente, seres nascem e morrem a todo instante. E nem sei se isso que escrevi é realmente o que penso ou se foi fruto de uma noite mal-dormida. Também não me pergunte o que respiro. Não sei nada de química...
OBS: Foto extraída do site http://www.usina.com/solo
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